Sem categoriaComo inovar nas indústrias portuguesas de processamento de pescado?

Como inovar nas indústrias portuguesas de processamento de pescado?

“A tradição já não é o que era!” – poderia dizer um português sénior acerca da gastronomia, da sua localidade ou da empresa em que trabalhou ou viu operar no seu tempo.

A verdade é que essa constatação pode e deve ser um fator positivo. Vejamos porquê e quais as diretrizes para a inovação no setor.

O desenvolvimento de tecnologia, o aumento do tempo de conservação dos alimentos ou a diminuição de recursos da pesca com a redução de quotas de pescado poderão ter sido fatores que ditaram a inovação do setor de processamento e transformação de pescado ao longo dos tempos. Ousar inovar num setor tão tradicional é o grande desafio que se coloca às empresas portuguesas no objetivo de aumentar a sua competitividade no panorama internacional, com aumento de produção e melhor oferta de produtos, mais diversificada e de melhor qualidade.

Os números não mentem

Nos últimos anos, o número de empresas do setor tem vindo a diminuir (de 203 em 2008 para 150 em 2020). O motivo deve-se essencialmente ao encerramento de conserveiras portuguesas (que chegaram a ser 400 em 1925[1]), à fusão entre empresas ou à aquisição destas por maiores grupos económicos. Apesar de serem cada vez menos, segundo os dados mais recentes do INE, as indústrias transformadoras da pesca e aquacultura têm vindo a aumentar a sua produção e faturação.

Em 2020, esta indústria atingiu uma produção total de 239 mil toneladas (comparativamente com as 233 mil toneladas em 2019) e faturou mais de 1 209 milhões de euros em 2020, um aumento de 3,1% relativamente aos resultados do ano anterior. A situação epidemiológica do COVID-19 vivida em 2020, potenciou esta conjuntura (através, por exemplo, dos períodos de confinamento,) e terá promovido o aumento da procura de pescado em conserva por parte dos consumidores, tendo-se mesmo verificado um aumento de 22,5% neste segmento[2].

Fonte: INE – Instituto Nacional de Estatística 2

Fonte: INE – Instituto Nacional de Estatística 2

Porquê inovar e recorrer à tecnologia?

É crucial que o setor se modernize conseguindo manter viva a imagem de um setor tradicional, ao mesmo tempo que se reinventa e cria produtos diferenciadores, inovadores e de maior valor acrescentado, que aliem os sabores de antigamente com as tendências e preferências dos consumidores. Para o consumidor atual não chega que o produto continue a ter o sabor de outros tempos: é atraído pelo aspeto da embalagem, combinação de sabores, transparência e qualidade em termos nutricionais, conveniência de ter uma refeição pronta a comer ou pronta a cozinhar, maior tempo de validade, menor processamento, uso de ingredientes naturais, biológicos e sem químicos adicionados, origem do produto local ou nacional, processos que tenham em conta o bem-estar animal e a sustentabilidade social, económica e ambiental ou “status quo” premium que o consumo lhe confere ao consumidor.

Por um lado, num setor tradicional, onde a mão de obra escasseia, é necessária a revolução e modernização dos sistemas tecnológicos, abraçando a indústria 4.0, onde o tratamento de dados, a sensorização e a monitorização em tempo real são os ingredientes para a tomada de decisão atempada que resulta na melhoria da qualidade, no aumento da capacidade produtiva e no aumento das receitas.

A tecnologia é particularmente interessante na melhoria de processos como a filetagem, evisceração ou corte em precisão; tecnologia de identificação e descarte atempado de peixe com deformações ósseas, calibre inadequado, presença de parasitas/microrganismos patogénicos; sistemas e cadeias de reaproveitamento e valorização de coprodutos que atualmente são valorizados para alimentação animal; soluções de embalamento mais sustentáveis e com menor uso de plástico; soluções de monitorização da qualidade; tecnologia de blockchain com rastreabilidade desde a origem e aumento de validade.

Implementar métodos e uma inovação aberta

Por outro lado, a indústria portuguesa de processamento de pescado necessita de olhar para outras indústrias, incluindo as indústrias não alimentares, e ousar inovar na gestão, explorando e aplicando as metodologias de gestão inteligente, que contemplam não só metodologias aplicadas à melhoria de parâmetros de produção, (e.g. Lean, Kanban, Kaisen, Six Sigma) mas também a adoção de sistemas ágeis de desenvolvimento de produto e de projetos, que melhorem a velocidade e qualidade dos produtos desenvolvidos pelas equipas de trabalho (como Scrum ou Stage-Gate).

A mudança de paradigma passa ainda por assimilar o conceito de “inovação aberta”, onde se quebra o tabu de abrir as portas a pessoas externas à organização, como órgãos públicos, consultoras, universidades, chefs de cozinha ou empresas do setor ou de setores totalmente distintos. O objetivo passa por trabalhar em conjunto, envolvendo todos os players e stakeholders, captando conhecimento externo e diferenciado, reduzindo o risco de falhar na criação de novos produtos de valor acrescentado com capacidade de internacionalização. A integração destes elementos nas diversas fases do desenvolvimento, desde as sessões de brainstorming e ideação às fases de prototipagem e lançamento no mercado é essencial para o sucesso do produto. De facto, estreitar colaborações permite às empresas aproveitar meios para diminuir custos e aumentar a sua visibilidade em feiras nacionais e internacionais.

Os incentivos europeus

Finalmente, a União Europeia exige cada vez mais que esta colaboração exista. A exigência de consórcios nas candidaturas a financiamento europeu, para investigação e desenvolvimento, é cada vez mais comum em expressão e em número. Sendo o financiamento público na inovação um dos motores das empresas para atingir o seu crescimento, é necessário que as empresas do setor estejam atentas à abertura de candidaturas aos novos programas operacionais que, na próxima década, serão possivelmente os que mais dinheiro irão mobilizar desde sempre: o Plano de Recuperação e Resiliência (que já arrancou) tem uma dotação de 16,6 mil milhões de euros, o Portugal 2030 tem dotação de 33,6 mil milhões de euros e há ainda o remanescente do Portugal 2020. Através destes ou de outros mecanismos surgirão os programas MAR 2030, EEA Grants ou os regionais (NORTE 2030, CENTRO 2030, entre outros), além de programas a decorrer, tais como o Horizonte Europa ou European Innovation Council. A acrescentar aos mecanismos citados, existem ainda o incentivo do SIFIDE, que permite às empresas deduzir até 82,5% dos custos relacionados com atividades de investigação e desenvolvimento no ano de referência.

Como se posicionar?

Os próximos anos representam uma grande oportunidade para as empresas setor do processamento e transformação de pescado para inovar e fazer os investimentos que necessitam para fazer crescer o seu negócio. Se dirige um negócio nesta área deve obrigatoriamente estar atento às oportunidades e pode contar com o B2E para isso, nomeadamente através do nosso serviço de Funding Watch. Contacte-nos para saber mais.

Referências:

1. A indústria das conservas de peixe em Portugal; TecnoAlimentar 5 – Dossier Mar & Aquicultura; Ano: 2018

2. INE – Instituto Nacional de Estatística (Portugal); Estatísticas da Pesca – 2021; Ano de Edição: 2022

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