Sem categoriaInovação Aberta na Bioeconomia Azul – uma abordagem de economia direcionada pelo conhecimento

Inovação Aberta na Bioeconomia Azul – uma abordagem de economia direcionada pelo conhecimento

Devido ao atual estado da arte tecnológico, o mundo está a tender para uma economia direcionada pelo conhecimento. De acordo com o Global Knowledge Index (GKI) da Knowledge4All (1), Portugal ocupa o 27º lugar (61.8 GKI) entre os países com os índices GK mais elevados, e apenas 10 pontos abaixo do 1º lugar – a Suíça (71.5 GKI). No entanto, quando se considera a variável população, verifica-se uma diluição do potencial de inovação, e, Portugal cai para o 34º lugar (1).

A Europa permanece a segunda região mais inovadora do mundo e, de acordo com o European Innovation Scoreboard (EIS), de 2020 a 2021 Portugal passou de um inovador forte a inovador moderado (2). Estes relatórios detalham positivamente as entidades inovadoras de Portugal, o ambiente favorável à inovação, o sistema atrativo de investigação, as PME que inovam internamente, a penetração da banda larga, e as PME com inovações de produtos e/ou processos (2). Por outro lado, Portugal apresentou lacunas a nível de inovação a de processos empresariais internos, de inovadores que não desenvolvem inovação dentro de portas, de escassas exportações de serviços com base conhecimento técnico intensivo, de baixo investimento em I&D no setor empresarial, de baixo nível de cofinanciamento em I&D público, e de baixa frequência de copublicações público-privadas. No entanto, Portugal está acima da média da União Europeia em nascimentos de empresas (10+ empregados), atividade empresarial total, e entradas líquidas de investimento direto estrangeiro, indicadores de elevado potencial.

Neste artigo, não nos centraremos nas razões pelas quais Portugal está atrasado na construção de uma sociedade direcionada pelo conhecimento visando impulsionar a inovação e o crescimento económico, uma vez que, tal como demonstrado acima, se trata de um problema complexo multifatorial. Em vez disso, concentrar-nos-emos na inovação aberta como motor do crescimento económico e apresentaremos as principais razões para a sua aplicação ao setor da Bioeconomia Azul.

A inovação, tal como definida na ISO 56000:2020 (3), é a implementação prática de ideias que resultam na introdução de novos produtos ou serviços ou na melhoria dos produtos ou serviços oferecidos. Tradicionalmente, a inovação acontece numa estrutura vertical fechada dentro de uma empresa. A investigação e desenvolvimento de novos produtos e serviços são feitos internamente, mantidos em segredo, e posteriormente, em devido tempo, alguns são apresentados ao mercado. Este processo sofre de um enviesamento intrínseco e natural, ignorando os concorrentes, e, por vezes o mercado, tendo desvantagens adicionais que serão abordadas mais abaixo.

Henry Chesbrough foi o primeiro a quebrar o paradigma da inovação com a introdução do conceito de inovação aberta (IA) em 2003 (4), e, que desde então, evoluiu naturalmente para um modelo onde as empresas utilizam ideias, processos e vias de entrada no mercado quer externas como internas, recorrendo a mecanismos pecuniários e não pecuniários alinhados com o seu modelo de negócio de forma a garantir avanços tecnológicos dos seus produtos, processos ou serviços, adquirindo uma vantagem colaborativa competitiva. Esta permeabilidade à inovação acaba por impactar ao nível do consumidor, da empresa, da indústria e da sociedade (Figura 1).

Figura 1: Inovação fechada vs. Inovação aberta
Figura 1: Inovação fechada vs. Inovação aberta

A implementação da IA requer uma mudança de mentalidade empresarial baseada na partilha de experiências, de conhecimentos e de tecnologias, dentro e fora dos limites da empresa. A chave do sucesso durante a implementação é concentrar-se em diversidade e no conhecimento do ecossistema de inovação disponível. Algumas das ações possíveis na jornada de implementação de IA são a aposta na diversidade da equipa interna, colaboração e cocriação com instituições e empresas I&D externas, ligação com start-ups inovadoras, organização de hackathons, de grupos de brainstorming e de crowdsourcing, e envolvimento com núcleos de inovação locais, regionais e internacionais.

Até agora, a IA ainda é considerada por alguns como um paradigma no que diz respeito à gestão de Propriedade Intelectual (PI), e um incómodo legal e desmerecedor de esforço. Contudo, alguns dos maiores requerentes de patentes do mundo, Philips NV, IBM, e Intel, abraçaram a IA como uma mudança estratégica e, após análise das suas atividades de submissão de patentes, não se observam efeitos deletérios (5, 6), e, em alguns casos, o número de pedidos aumentou. Estas empresas elevaram o nível da sua inovação, de forma a acomodar uma extensa troca de informação de, e com, os seus parceiros de colaboração (concorrentes e instituições de I&D) e a gerir as relações de colaboração em conformidade, de modo a não comprometer a sua PI ou a dos seus parceiros.

A inovação aberta e colaborativa exige que as empresas se envolvam na governança da PI de forma mais ativa e estratégica, não só em termos de aquisição e defesa, mas também de forma a defender os direitos de PI, e a gerar royalties. A transmissão de ideias inventivas, seja num formato formal ou informal, destrói a novidade num pedido de patente, pelo que se deve ter cuidado com a partilha e divulgação de informação num projeto de IA, e os acordos de colaboração devem regular claramente este aspeto.

Embora a gestão dos resultados de conhecimento gerado de forma colaborativa, num novo ecossistema aberto de investigação, seja um desafio, a PI é ferramenta fundamental para superar a imprecisão na definição e no âmbito do conhecimento ou da tecnologia a ser desenvolvida colaborativamente, auxiliando assim na redação um acordo de colaboração. Uma patente ou outro direito de PI, sendo um documento legal, apresenta uma linguagem adequada à redação de acordos de licenciamento e pode ser utilizada como uma ferramenta de negociação e mitigação de litígios com terceiros que detenham tecnologia complementar. Além disso, os acordos de licenciamento com terceiros promovem o desenvolvimento de uma tecnologia que, de outra forma, se arrastaria a entrar no mercado ou não alcançaria uma aplicação distinta noutros mercados.

Os benefícios da IA via projetos colaborativos poder-se-iam resumir a um aumento de networking, e a uma diminuição de investimento/custos, do risco e do tempo de colocação no mercado, no entanto, há muito mais. A cocriação e a disseminação de resultados e de tecnologia geram novas ideias para produtos, criam mercados para tecnologias disruptivas, e promovem a criação de novos modelos de negócio e empresas.

A Comissão Europeia declarou que “para fazer face a uma população global crescente, ao rápido esgotamento de muitos recursos, às crescentes pressões ambientais e às alterações climáticas, a Europa precisa de alterar radicalmente a sua abordagem à produção, consumo, processamento, armazenamento, reciclagem e eliminação de recursos biológicos” (7). Devido aos prementes desafios globais, os projetos de IA são os instrumentos mais adequados para alcançar soluções inovadoras, e a aquacultura e a biotecnologia azul, os pilares da Bioeconomia Azul, são considerados estratégicos (7).

Os versáteis produtos para alimentação humana derivados da Bioeconomia Azul contribuem para a mitigação da crescente tendência de procura de proteínas, melhoram a segurança alimentar, e a saúde humana sem esgotar os recursos naturais, ao mesmo tempo que, em alguns casos, sequestram CO2 da atmosfera. Os produtos de elevado potencial não-alimentares da Bioeconomia Azul, total ou parcialmente derivados de materiais de origem biológica, incluem produtos farmacêuticos, cosméticos, matéria-prima química, lubrificantes, detergentes, tintas, fertilizantes, têxteis, mobiliário, bioplásticos, biocombustíveis e bioenergia.

Os projetos colaborativos no setor da Bioeconomia Azul podem render variadas cadeias de valor inovadoras e a entrada no mercado de produtos sustentáveis inovadores, enquanto visam rentabilizar tecnologias aplicáveis a diferentes áreas (8) O Kg de biomassa produzida tem um enorme potencial de rentabilização (Figura 2), e a sua utilização total é essencial (9).

Figura 2: Pirâmide de valores volume/lucro para diferentes aplicações na Bioeconomia Azul
Figura 2: Pirâmide de valores volume/lucro para diferentes aplicações na Bioeconomia Azul

Para materializar processos verdadeiramente circulares, de desperdício zero, economicamente viáveis, deve recorrer-se a uma abordagem de IA para todos os subprodutos da Bioeconomia Azul (Figura 3). Recentemente, em Portugal, foi criado e financiado um Consórcio multidisciplinar, baseado nos princípios da IA, com o objetivo de reindustrializar as empresas nacionais através da incorporação de produtos da biotecnologia azul nas suas cadeias de valor (10). Este é um momento de mudança na mentalidade empresarial portuguesa, e os resultados e impacto deste esforço de IA serão concluídos até ao final de 2025. Esperam-nos tempos emocionantes!

Figura 3: Potencial para Inovação Aberta e para sinergias entre diferentes setores da Bioeconomia Azul
Figura 3: Potencial para Inovação Aberta e para sinergias entre diferentes setores da Bioeconomia Azul

Referências:

  1. Knowledge4All (2021) Global Knowledge Index; Knoema.
  2. European Commission (2021) European Innovation Scoreboard: Innovation performance keeps improving in EU Member States and regions; Press release; Brussels.
  3.  “ISO 56000:2020(en)Innovation management — Fundamentals and vocabulary
  4. Chesbrough HW (2003) Open Innovation: The New Imperative for Creating and Profiting from Technology; Harvard Business School Press; Boston, Massachusetts; USA.
  5. European patent office (2020). Patent Index 2020; Munich; Germany.
  6. European patent office (2021). Patent Index 2021; Munich; Germany.
  7. European Commission. (2012). Innovating for Sustainable Growth: A Bioeconomy for Europe, Communication. Brussels.
  8. European Commission, Directorate-General for Maritime Affairs and Fisheries (2019) Blue Bioeconomy Forum- Roadmap for the blue bioeconomy, Brussels.
  9. Barbier M, Charrier B, Araujo R, Holdt SL, Jacquemin B, Rebours C (2019). PEGASUS – PHYCOMORPH European Guidelines for a Sustainable Aquaculture of Seaweeds, COST Action FA1406 (Barbier M. and B. Charrier B., Eds), Roscoff, France. https://doi.org/10.21411/2c3w-yc73
  10. Pacto de Inovação da Bioeconomia Azul, Inovamar Lda.
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